sábado, 17 de dezembro de 2011

escritura automática ii

o saquê é fermentado e não destilado. eu já estou receoso de ter de interromper essa escritura por estar escrevendo com um lápis cuja ponta de grafite pode ser exaurida a qualquer instante. quer dizer, no instante em que ela for de fato precisarei parar. que não é agora, felizmente. ora, mas é preciso parar alguma hora. seja porque a ponta acaba, e a escrita fica difícil, o gesto da mão fica difícil, tem que mudar a inclinação e tal. seja porque... o negócio é seguir enquanto der. quando não der mais, pára. é possível que haja um último fôlego, na forma de uma derradeira extensão cinza de grafite. aí pode-se retê-lo para o fim da idéia. mas será necessário, realmente necessário? será que a idéia precisa disto? deste último fôlego? há também a questão muscular. e não conta, não importa se estamos a lápis ou a máquina de escrever. os músculos cansam mesmo. eles vão ficando mais rígidos, mais pétreos. sim, vão endurecendo. e quando algo endurece é dizer adeus. se for movê-lo é perigoso, pois uma queda e pronto: quebra. se for vidro então quebra na hora. eu já vi todavia copos de vidro caírem e não quebrarem. e caíram em azulejo de pedra. talvez tenha sido um caso atípico. uma certa angulação especial, um certo momento da queda em que o copo realiza uma peripécia qualquer e não quebra. o copo se preserva também. quê! vou quebrar? não dessa vez, e faz aquela virada crucial. nós não estamos acostumados com isso. ó! que coisa mais fantástica! não quebrou. essa merda não quebrou. quereríamos tivesse quebrado, seria mais fácil para nossa vida. depois tem que ficar contando pro pessoal: você não vai acreditar. o copo caiu e não quebrou! a vida seria mais fácil se as coisas quebrassem de uma vez por todas. seria um motivo evidente para colá-las. ou comprar outras, que é assim que se faz normalmente.

Nenhum comentário: